os anagramas de Varsóvia
Sendo uma das minhas temáticas favoritas, a fasquia encontrava-se bastante alta à partida para as primeiras páginas. Com o gueto de Varsóvia como pano de fundo e um clima de thriller à mistura, Richard Zimler prendeu a minha atenção logo desde o início, e fossem outros os tempos, onde tinha tempo para fazer coisas que levam o seu tempo, a leitura deste livro poderia ter batido recordes de velocidade. A personagem principal guia o leitor pelo desenvolvimento dos acontecimentos, mostrando uma complexidade que se manifesta no complexo modo de referência às coisas recorrendo aos anagramas e segundos sentidos, mas também porque se mostra rica em manifestações de tristeza e alegria, marasmo e humor. É assim deste modo que um dos mais cruéis aprisionamentos de seres humanos da história é apresentado, pela convivência com o dia-a-dia de pessoas que tal como Erik Cohen se limitavam a acordar no dia seguinte, sabendo que poderiam muito bem não chegar a ver o próximo. O velho psiquiatra Judeu encarna todo um estereótipo mimetizado pela forma brutal como vê o seu sobrinho-neto partir, ou pela exaustão do sofrimento que faz a sua sobrinha sucumbir, sobrando-lhe ainda forças para encontrar o norte da sua razão de existir, sentido que lhe garante uma sobrevivência que não se esgota na componente física, mas transcende para a mente das pessoas que não podem ficar indiferentes perante uma história que não é ficção. A 2ª Guerra Mundial existiu, os campos de concentração foram uma realidade, os muros que delimitavam os contornos dos Guetos forma edificados, e cerca de 6 milhões de Judeus não puderam comemorar o dia da Vitória na Europa, a 8 de Maio de 1945. Obras como esta servem para não esquecer os actos mais bárbaros, inverosímeis e ignóbeis que o homem é capaz, e desde essa data que outras vitórias se comemoraram, mas infelizmente ainda existem muitas outras para alcançar.