inceneradora Eleitoral
Consultando um bom dicionário de tugalês, o leitor poderá confirmar que o termo urna pode assumir diferentes significados, dependendo cada um daquilo que com a mesma se faz. No fim de contas, a única coisa comum a todos é o facto de numa urna se depositar algo, sejam restos mortais, cupões de lotaria, rifas, ou boletins de voto. Em termos de sentimento as urnas eleitorais estão para o eleitor como as urnas dos cupões da lotaria para o apostador, vivendo ambos na expectante esperança que o seu boletim seja o feliz contemplado vencedor. No entanto, se a lei da probabilidade adverte o apostador para a mais que provável derrota no universo quase infinito do acerto impossível dos números vencedores, a lei dos homens deveria fazer o mesmo ao eleitor, parte essencial e única do sistema democrático. Quando digo deveria, digo porque eu próprio não acreditando já em quase nada do que é apresentado a escrutínio, continuo a religiosamente cumprir com o dever cívico de exercer o meu direito de voto. Entre propagandistas do olha para o que eu digo e não para o que eu faço, entre os oportunistas da altura certa para piscar o olho ao poleiro do poder, entre os discos riscados que teimam eu não passar do tempo dos LPs, entre os que sabendo da derrota certa não se coíbem em prometer o impossível, e entre os que governando se esquecem de uma boa parte da sua ideologia política, o termo Urna não poderia ter sido melhor escolhido para designar o local onde depositamos o boletim de voto, o local onde se incinera a democracia, e onde acabam por ficar depositados os restos mortais da esperança dos eleitores que cada vez menos acreditam no menos mau de todos os sistemas...